Há coisas que nem queremos saber que são. Tinha lido no jornal, talvez tenha feito uma careta (ninguém se incomodou com a mímica, pelo que deve ter sido coisa discreta) e passei à frente. Estamos por tanto que será mania picuinha querer que se guardem cicatrizes em frasco de álcool. E hoje a liberdade que se discute e se quer cada vez mais larga é a dos leões no mercado e os profetas dela vestem bem e reúnem-se no Convento do Beato a mostrar peúgas de seda e sede de desmanchar para mudar com treino de poses de ministros.
Á noite, como costume, pousei
aqui, em visita mais estimada que à do jornal lido em relance. E a coisa regrediu e senti-me com vergonha de, em vez da careta que ninguém notou, não ter dado um berro que, pelo menos, espantasse os meus condóminos habituados à minha pacatez sombria de transportador de rugas a quem passou a hora de sonhar mudar alguma coisa no mundo, tirando um ou outro resmungo.
E a nobre e brilhante
chuinga, não foi por mal sei-o bem, trouxe-me à ideia a manhã em que o sol me bateu na cara quando pisava o passeio e deixava para trás o portão onde um
senhor inspector, em despedida, disse aos meus vinte e um anos que me esperava no regresso. Assim se marcava, então e ali, a escolha da juventude
lá voltar ou ficar paralítico de dignidade com o medo de
lá voltar. A liberdade do mercado vai transformar o
antro em condomínio fino da zona nobre alfacinha. É caso para nos sentirmos mais
livres, segundo os cânones do que é actual. Mas, por mim, fico com um risco mais nas rugas. Porque, até da memória, o mercado nos vai libertando.