Dedicado ao João Abel Freitas, amigo e prezado companheiro (da blogosfera, mas não só) porque, assim, calado que nem um rato na euforia futebolística, ele não tresmalha do caminho da serenidade e da sapiência na boa hora de expor medidas de racionalização necessárias à boa função da Administração Pública.Há dias assim. Quantas vezes, a quebra de carácter sucede à breve mas vibrante euforia? Mas é. Acontece. Sem explicação, apenas porque acontece. E se acontece é porque é. Hoje, amanheci com um sentimento de remorso. Eu sabia, isto vai-me acontecer um dia. E foi.
Hoje, ao contemplar nostalgias trágicas derramadas em rostos à hora do café matinal, lembrei-me que afinal
eles existem, esses
outros que vestem às riscas como se um relvado fosse lugar indicado para andar a correr com o pijama vestido, não são só na arrogância provocatória a viver mais das minhas derrotas e vergonhas que dos seus feitos, armados em viscondes da jogatana mas mestres únicos no sofrimento disfarçado com maneiras de elite e a esconder, na bainha do cachecol, o punhal de gandulo. Revelando que é essa a sua identidade, desejada ou não, de gandulos mesmo, como os saídos do extinto
Café Aviz, ali nos Restauradores, ou para comemorar feitos ou para dar com a matraca nos subversivos da liberdade, para mais na Avenida com esse nome.
(nunca me esquecerei que, das maiores porradas que apanhei na minha vida, daquelas de ficar ali enroscado no chão e só preocupado em proteger a tola, a maioria vinha dos gandulos aquartelados no Aviz, quartel general do Cazal-Ribeiro e de tudo que era ultra, verdes de serem legionários e não só, embora esta lembrança seja só referência da parte folclórica da memória e, por isso, benigna no cristal do ressentimento)Ao ver a tristeza melancólica substituir a basófia preparada para o foguete da fava contada, vi-me possuído por um enorme sentimento de culpa. Sobretudo, por observar como a grandeza arvorada se estende tão facilmente ao comprido. Só ultrapassei isso pela relativização e pela expiação através de treino de isenção. Afinal, uma compensação e não mais que isso. Porque não seria capaz de dar com uma matraca a alguém caído ao chão, fosse por inépcia, por azar ou por defender o que não devia e no sítio errado. E pelos
outros, senti o seu desconsolo como se de primos meus fossem, condição que nunca serão por não merecimento. Pois, passou-me breve a alegria, e, como a desforra não me anima, tive pena deles e de a sorte me bafejar, metendo-os ao léu do desânimo numa noite tão fria.
Esta subida ao céu da superioridade, traz um apelo de grandeza que nos induz à indulgência, até a sermos magnânimos. Por isso, confesso estas duas sentenças sinceras:
- O golo do
Paíto (bravo moçambicano, filho do Moçambique que tanto estimo) é um momento único de hino à beleza possível e máxima do futebol e à vontade indómita de ganhar, onde não se percebe o que é maior - o génio do talento ou a vontade irreverente de resolver.
- O
Paíto não merecia a vingança do vil
Simão (bravo patrício meu, da banda de Vila Real), porque é muito triste e feia esta desforra entre génios, pior ainda ver um génio veterano, com talento tirado da manga da inveja, a matar de ferro frio e largo um génio irmão mais novo, no preciso momento em que este se revela em talento feito vontade.