Muito se tem falado, a propósito da
deriva santanista, sobre a mudança de matriz do
PSD, e que teria descambado num tal
PSL. Sobretudo por parte da velha oposição interna, os puristas que se reclamam da
pureza de Sá Carneiro, identificada como uma pretensa natureza ideológica social-democrata (firmada no centro-esquerda).
Mas a verdade é que o PSD foi tão social-democrata como o CDS foi do centro ou sequer democrata-cristão. Ou seja, pouco ou nada, antes por máscara. E máscara conveniente pelos tempos da época em que
não ser socialista, para lá não caminhar, com ele não emparceirar, valia opróbio público, cujos riscos poucos quiseram correr.
O PSD afirmou-se social-democrata quando o PS dizia que o não era. E ser então
social-democrata era colar-se chegadinho ao PS do seu lado direito. Mas, na sua essência, o PSD resultou da adaptação do conglomerado de interesses (muitos deles, pequenos e médios) que vivia confortável com o Estado Novo. Com uma componente rural poderosa proveniente das antigas ligações clientelares com gestão entregue a uma intelectualidade urbana da média burguesia que, antes e com Marcelo, havia embarcado no projecto da
Primavera. No fundo, o PSD foi uma versão adaptada e revista do
marcelismo sem Marcelo. E, em termos de eficácia política, não foi pequeno o mérito de Sá Carneiro ter feito, em pouco tempo e num contexto de revolução, a adaptação das raízes implantadas da ANP num partido de resistência da burguesia à revolução, expurgando-a dos elementos salazaristas, ultras e radicais (que caíram, na maior parte, no colo do CDS).
Não admira que o PSD ideologicamente nunca fosse nada e, na prática, sempre tenha sido uma gestão de interesses feita de
mansinho. Construindo princípios, valores e líderes,
ao momento, isto é, conforme as possibilidades de acesso ao poder e da conservação dos interesses representados. Normalmente, por contraponto, contrariando no poder ou na oposição, as afirmações de valores de esquerda, ajustando o seu radicalismo à medida das transformações sociais que colidissem com interesses instalados ou a instalar.
Como estranhar pois que o
mesmo PSD, o de Sá Carneiro, tenha dado Cavaco, Durão, Alberto João Jardim, Pacheco Pereira e Santana Lopes? Por não ser social-democrata ou seja o que for. Por ser um partido
mutante. Na essência, para além da retórica.
Por uma questão de rigor, acusem de tudo Santana Lopes, menos que ele
está a descaracterizar o PSD. A haver mudanças, elas são de
caracterização. O alinhamento do PSD com o neo-liberalismo representa a primeira fase de autenticidade em que o PSD quer ser aquilo que é, dizendo-o. A que não será alheio o facto de agora ser a vez de a
esquerda não saber que terrenos ideológicos pisa (o marxismo-leninismo do PCP é apenas uma teimosia histérica e o Bloco é o que Louçã vai pensando sobre a adaptação casuística das sobras do trotsquismo tardio) e o PP assumir, cada vez mais claramente, o seu encadernamento de extrema-direita.