
Ainda estão para decifrar todos os esses e erres da técnica usada pelos antigos egípcios no processo de mumificação. E entender toda a ideologia desse ritual.
Sabe-se que a mumificação tinha em vista preparar os corpos para a vida eterna (o mesmíssimo sonho dos Camaradas que queriam e querem - conservar o mito de Lenine para nos inspirar para todo o sempre a preferir a revolução à democracia). No caso dos egípcios antigos, a vida além da morte era concebida como prolongamento da vida terrena (em versão melhorada). Com o corpo, as utilidades e os bens. Eles iriam viver após morte como cá, mas, de preferência, melhor. Se passassem na avaliação de desempenho feita por uma consultora da moda contratada pelos deuses...
Conhece-se muito mas não tudo. Adquirido é que as vísceras (partes moles) eram extraídas por um corte lateral no corpo que depois era sujeito a tratamentos vários de conservação. As vísceras extraídas eram conservadas num vaso próprio depositado ao lado do corpo para que o passante à vida eterna pudesse usar convenientemente o estômago, os rins, o fígado, os intestinos e outras utilidades ali depositadas e à mão de semear para sua utilização. Duas partes ficavam de fora e com destinos diferentes. O coração não era extraído e o cérebro era tirado a partir do nariz e atirado para o lixo.
O coração ficava no corpo mumificado porque da sua avaliação pelos deuses dependia o veredicto sobre o direito à vida eterna. Se, quando colocado numa balança, os deuses confirmassem que ele pesava menos que uma pena de ave, o candidato era encaminhado para o sucesso da vida eterna. Assim, os egípcios de coração leve por aí andarão ainda nas voltas dos nossos caminhos. Mas os de coração grande, mesmo que aumentado por colheitas de solidariedade, finaram-se no finito. Fica-me o mistério do porquê se preferirem corações leves. Até parece que eles adivinhavam o neo-liberalismo dos nossos dias. Sei lá.
Quanto ao destino do cérebro, o mistério é bem menor. Pensar, ser, saber, sentir, sempre foram lixo comparando com ter e poder. Não é?
(Foto de Pedro Tunes)