![r3813820606[1].jpg](http://agualisa.blogs.sapo.pt/arquivo/r3813820606[1].jpg)
Poderia ficar a dúvida, por um post recente, que me tornei num defensor tardio do Bloco de Esquerda. Nem pensar. Deus me livre que para ali não está guardada a remissão dos meus pecados. Só não gosto é de condenações apressadas e de rápido tiro na nuca. Até porque o pior, em polÃtica, é subestimar adversários.
Disse e mantenho que o Bloco já não é o que era. Engordou, conservando a elegância. Mas no tremendo pânico de se tornar respeitável por se aproximar da idade de ser responsável e consequente pelos seus actos. Um género polÃtico do adolescente quase homem e à beira de constituir famÃlia, não despegando do sentimento de perda da protecção maternal.
Ainda ostenta na parede da sala de visitas, como avôs protectores, as figuras tutelares da sua origem imaginativa em que, de grupelhos espalhados, construÃram um albergue de juventude. Lá estão o patriarca Louçã, o irmão mais velho e o inteligente para todo o serviço; Portas, o da energia partidária como se nunca tivesse saÃdo da UEC; Fazenda, émulo de classe do Bernardino da cadeira revisionista ao seu lado; Rosas, o professor sábio e bom que nunca ralha e a todos dá notas porreiras. Assinalando, todos os quatro, a santÃssima quadratura que assistiu ao parto do cÃrculo, meio partido, meio tertúlia. Mas com o mérito assinalável de, comprometendo sem comprometer, fugindo da definição e da ideologia como diabo da cruz, purificados pela distância do poder, absorvendo com talento os inputs da comunicação de efeito por perda de cor, recorrendo à s formas de atracção do
teatro de rua, especializando-se nas performances a substituir a chatice dos comÃcios, concentrando, enfim, o poder atractivo da
radicalidade pura (mas
dura, quando necessário). De tudo resultando, esse produto vendável que é a
esquerda ecologicamente polÃtica.
O certo é que o Bloco cresceu e crescerá. Tem esse poder de depósito de votos dos que estão em trânsito ou zangados com as
postas mirandesas da esquerda. Com a vantagem digestiva, como fast food que é, de não nos amarrarem tempos inúteis à mesa à espera do cozido e dispensarem a água bicabornatada para a ressaca. Cada um pode abancar-lhe à mesa sem procurar saber do vizinho de onde vem e para onde vai. Todos estão de passagem. Todos são inteligentes. E se a pressa é grande, também ali se pode fazer
take way, pega-se, leva-se para o sofá de casa, espreita-se as homilias do Louçã na tv, resmunga-se contra a esquerda velha e contra a esquerda que é direita, deposita-se o voto e venham novas eleições para termos mais votos.
Para além dos méritos evidentes da manutenção da frescura no seu poder de atracção, que parece não ter esgotamento à vista, o Bloco desempenha um papel não desprezÃvel, filantrópico até, de manter gentes diversas na ilusão de uma opção de prática de esquerda. E, por isso, o Bloco é bom para a esquerda. É terapia para o desencanto e para a deserção. Congelando utopias, conserva sonhos à beira da descrença.
Um dia, com barba grossa e barriga a começar a pesar, o Bloco vai ter de pensar em casar, montar casa e aturar e alimentar famÃlia. Deixando de viver das mesadas dos órfãos e do efeito do protesto. Oxalá aguente até isso se ver. Sem Bloco, esta esquerda perdia a graça toda.