
O
Altino lamenta-se, mais uma vez, e eu percebo-o. Se percebo. Que bem que percebo.
Mas, meu caro, isto é como tudo. O hábito faz o adepto. Neste caso, também o sofredor.
Claro que depende do ximbaláu. Então ou nos aguentamos no balanço e ficamos com alma de aço ou desistimos. Eu sou dos que não desisto. E acredito que o
Altino também não.
Tomei lugar cativo no lugar de culto com a vinda de um célebre poeta de inspiração germânica que nos escaqueirou os altares e as sacristias. Aguentei outros curandeiros que, afinal, conseguiram pior. Até que ganhei a serenidade de me emocionar noventa minutos de cada vez, sacudindo alegrias e tristezas após o apito final. Mas para chegar a essa gestão cardíaca precisei de uma dose de cavalo. E apanhei-a. Sem largar o lugar cativo, até que resolveram demolir a igreja matriz. Para a nova Sé, só para lá caminhei uma vez, mais para conhecer a coisa. Um dia, o cativo voltará quando vir que os rapazes que correm em cima do tapete verde me respeitam como devoto. Por enquanto, guardo distância com terço rezado frente à tv. Continuando a sofrer, fiel à teimosia.
Pois a minha dose cavalar ocorreu um dia quando me meti a caminho da Galiza com uns peregrinos aqui do meu bairro. E o que mais me custou, pela humilhação, foi ver aquela cambada que hoje vê jogos da segunda divisão espanhola, a quererem consolar-me. Já nem eles se estavam a sentir bem com o fartote, o que diria eu. Calhou ir para camarote com uns amigos de Vigo que me iam consolando e já inventavam desculpas que o árbitro estava a ser parcial com as faltas e a favor deles. E eu sem perceber bem o que me estava a acontecer a mais de quatrocentos quilómetros de casa. Limitei-me a ir-me enfiando dentro do kispo vermelhusco e com os olhos estupidamente abertos. No fim, eu e os meus companheiros de infortúnio fomos beber copos para apagar a mágoa céltica. E não é que um sacana de um galego nos olha e faz questão de nos pagar as bebidas, dizendo que não suportava o nosso ar enfiado? Depois foi ver gente emudecida, patrícios que pareciam fantasmas a deambularem pela noite de Vigo, com esporádicos ataques de revolta como de um que se auto-flagelava, puxando-me pela manga do kispo, por ter vindo de Bragança para sofrer aquela desgraça e eu a tentar acalmá-lo com o único argumento de consolação de que tinha vindo de muito mais longe. Pois, desde Vigo, que estou por tudo. Desde que não perca, é claro. E é por isso que percebo o
Altino.